O trabalho escravo moderno é uma chaga persistente na sociedade brasileira, que desafia leis avançadas e políticas estruturadas.
Nosso estudo, baseado em uma análise inédita de 20.414 processos judiciais entre 2015 e 2025, revela uma realidade alarmante: o problema não está restrito a pequenos negócios informais, mas permeia grandes corporações bilionárias, afetando milhares de vidas diariamente.
Neste artigo, apresentamos um panorama detalhado do trabalho escravo moderno no Brasil, destacando os principais dados jurídicos, o perfil das vítimas e exploradores, os setores e regiões mais afetados, além dos desafios da justiça e das oportunidades que a tecnologia oferece para o combate a essa grave violação de direitos humanos.
O cenário atual do trabalho escravo moderno: números e evolução
Para compreender a dimensão do trabalho escravo moderno, é fundamental analisar os números que compõem esse cenário.
Entre 2015 e 2025, o Brasil registrou 20.414 processos judiciais relacionados ao trabalho em condições análogas à escravidão, resultando em uma média de 1.856 novos processos por ano, ou seja, mais de cinco casos diários durante uma década.
Em termos econômicos, os processos movimentaram R$7,06 bilhões, mostrando que o trabalho escravo é também um problema que envolve grandes recursos financeiros.
Nesse sentido, o ano de 2019, justamente antes da pandemia, foi o pico histórico com 4.827 novos processos, reforçando uma relação preocupante entre a fiscalização ativa e o número de casos detectados.
Além disso, a maior parte dos processos (96,5%) envolve a caracterização completa de trabalho em condições análogas à escravidão, destacando que não se trata de simples irregularidades trabalhistas, mas de violações graves e sistemáticas.
Em menor escala, outras modalidades incluem jornada exaustiva (3,54%), trabalho forçado, restrição de locomoção e tráfico de pessoas, embora estas sejam menos frequentes.
Evolução dos casos anuais e contexto
- 2015: 1.191 processos – R$ 236 milhões movimentados
- 2016: 2.987 processos (ápex da crise econômica) – R$ 852 milhões
- 2019: 4.827 processos (pico histórico) – R$ 2,15 bilhões
- 2025 (projeção): 992 processos – R$ 386 milhões
Dessa forma, o crescimento desses números está ligado diretamente à vulnerabilidade econômica da população.
Por exemplo, crises econômicas como a recessão de 2016 aumentam a exposição das pessoas a situações de exploração, gerando assim mais vítimas de trabalho escravo moderno.
Distribuição geográfica e setores mais impactados pelo trabalho escravo moderno
Uma das principais descobertas do estudo é a concentração geográfica e setorial do problema.
O estado de São Paulo aparece como o epicentro nacional do trabalho escravo moderno, concentrando 50,88% dos processos de trabalho escravo no país. Notavelmente, a capital paulista, sozinha, responde por 30,53% dos casos.
Essa concentração, no entanto, não reflete apenas maior incidência, mas também maior capacidade institucional de detecção e fiscalização.
Por outro lado, a subnotificação em regiões como Norte e Nordeste pode fazer o problema parecer menor nessas áreas, quando, na verdade, pode ser tão grave quanto em outras regiões.
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Distribuição regional dos processos
- Sudeste: 61,21%
- Centro-Oeste: 13,56%
- Sul: 11,11%
- Nordeste: 10,29%
- Norte: 3,83%
Além da questão territorial, a diversificação setorial é um aspecto preocupante.
Historicamente ligado à agropecuária e à construção civil, o trabalho escravo moderno expandiu-se para setores urbanos, incluindo transporte rodoviário, restaurantes, bancos múltiplos, vigilância e até administração pública.
Top 10 setores com mais casos
- Construção de edifícios (777 processos)
- Comércio varejista geral (601 processos)
- Transporte rodoviário de carga (484 processos)
- Restaurantes e similares (304 processos)
- Serviços de escritório e limpeza (282 processos)
- Vigilância e segurança (279 processos)
- Administração pública (275 processos)
- Lanchonetes e similares (222 processos)
- Bancos múltiplos (197 processos)
- Serviços de engenharia (196 processos)
Esse crescimento do problema em setores sofisticados demonstra que o combate ao trabalho escravo moderno exige uma abordagem ampla, que vá além da fiscalização rural tradicional.
Além deste levantamento sobre os setores mais impactados pelo trabalho escravo moderno, a Predictus também realizou uma análise específica sobre os segmentos que mais recorrem à recuperação judicial no Brasil. Se esse tipo de panorama setorial te interessa, você pode acessar o artigo completo sobre.
Perfil dos exploradores e das vítimas no trabalho escravo moderno
Ao contrário do mito que associa o trabalho escravo a pequenos negócios informais, o estudo revela que quase metade dos casos envolve grandes empresas, com 47,92% dos processos concentrados nesse grupo.
Além disso, 19,25% dos casos são contra grupos econômicos bilionários que, em tese, possuem estruturas robustas para prevenir tais abusos.
Segundo os dados:
- Grandes empresas: 7.794 processos
- Microempresas: 6.186 processos
- Pequeno porte: 2.285 processos
No que diz respeito às vítimas, há uma predominância masculina (71,08%), mas mais de um quarto são mulheres (26,47%), refletindo a inserção do trabalho escravo em setores tradicionalmente femininos, como confecção e serviços domésticos.
A maioria dos casos revela ainda uma grande vulnerabilidade social, com 76,4% dos processos recebendo justiça gratuita para as vítimas.
Perfil das vítimas e vulnerabilidades
- Homens: 14.510 casos
- Mulheres: 5.403 casos
- Entidades (MPT, sindicatos): 501 casos
A prevalência de processos digitais (99,86%) contrasta com a precariedade das condições em que vivem as vítimas, mostrando um sistema judicial moderno que muitas vezes não corresponde à realidade do trabalhador explorado.
Aliás, o impacto da precarização nas relações de trabalho vai além da exploração física. Em outro estudo realizado pela Predictus, analisamos como o burnout tem afetado a saúde mental dos trabalhadores e gerado riscos institucionais crescentes nas empresas. Se esse tema também te interessa, vale a pena conferir os dados acessando o artigo completo.
A lista suja e a resposta da justiça: avanços e desafios
A “Lista Suja” do Ministério do Trabalho é um dos principais instrumentos para o combate ao trabalho escravo moderno.
Em 2025, ela contava com 745 empregadores cadastrados, responsáveis por manter trabalhadores em condições análogas à escravidão, desde pequenos produtores rurais até grandes indústrias alimentícias.
Porém, a análise dos desfechos processuais revela um paradoxo inquietante: quase metade dos casos (49,48%) termina em acordo judicial, e não em condenação. Isso pode representar uma espécie de impunidade disfarçada, dado que acordos podem ocultar o reconhecimento completo da responsabilidade e impedir punições exemplares.
Tipos de decisões judiciais:
Somente 10,17% das sentenças mencionam explicitamente “trabalho escravo”, enquanto 9,81% fazem referência a “condições degradantes”, indicando dificuldades na caracterização jurídica que impactam diretamente no rigor das decisões.
Trabalho escravo moderno, crises econômicas e sazonalidade
Nosso levantamento identificou que crises econômicas agravaram o problema, com um aumento expressivo de casos durante recessões e períodos de instabilidade.
Por exemplo, a recessão histórica de 2016 coincidiu com o ápice nos processos relacionados a trabalho escravo, disparando para 2.987 casos.
Isso acontece porque o desemprego crescente e a precarização das condições de trabalho aumentam a vulnerabilidade das pessoas ao enfrentarem situações degradantes.
Além disso, a sazonalidade dos casos mostra que dezembro concentra quase um quinto dos processos, um reflexo das pressões produtivas no fim do ano. Março e novembro também apresentam índices expressivos.
Casos por mês (destacados)
- Dezembro: 18,59% dos casos (3.794 processos)
- Março: 8,47%
- Novembro: 8,27%
Esses fatores indicam que o trabalho escravo moderno tem um ciclo que acompanha o mercado e a dinâmica econômica, reforçando a necessidade de ações preventivas contínuas.
O papel da inteligência artificial no combate ao trabalho escravo moderno
Uma das inovações mais promissoras no enfrentamento desse problema vem do uso da inteligência artificial para identificar padrões de risco e direcionar a fiscalização.
Nosso estudo utilizou machine learning para apontar os cinco fatores mais importantes para a predição de casos:
- Setor econômico (14,1%)
- Ano de distribuição (13,8%)
- Idade da empresa (12,9%)
- Capital social (12,3%)
- Localização (11,4%)
Esse modelo revelou combinações de maior risco, por exemplo:
- Construção civil + empresa jovem + São Paulo/Goiás/Mato Grosso
- Transporte + microempresa + baixa presença digital
- Confecção + crescimento rápido + região metropolitana
Dessa forma, a tecnologia traz um salto qualitativo para a fiscalização, concentrando esforços onde as probabilidades são maiores e aumentando a eficácia no combate ao trabalho escravo moderno.
Conclusão: um desafio para todo o Brasil
O trabalho escravo moderno no Brasil é um problema complexo e estrutural, que exige comprometimento coletivo. Nosso estudo mostra que a exploração ultrapassou os limites das fazendas isoladas para atingir grandes grupos econômicos e setores variados da economia urbana.
Apesar de avanços legais, instrumentos como a Lista Suja e o uso de inteligência artificial, ainda há ineficiências na justiça, com uma alta prevalência de acordos que podem mascarar a impunidade.
Portanto, é urgente repensar políticas públicas, reforçar a fiscalização contínua e mobilizar a sociedade para enfrentar esse desafio do século XXI.
Erradicar o trabalho escravo moderno é não apenas uma questão de justiça, mas um passo essencial para a construção de uma sociedade mais digna e igualitária.
Nesse contexto, contar com dados jurídicos estruturados pode fazer toda a diferença na gestão de riscos e na tomada de decisões mais responsáveis. A Predictus oferece a maior base de processos judiciais do país, com atualizações diárias e cobertura nacional.
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